por
Luciana Alves
A revolução tecnológica possibilitou a prática de uma clínica onde os dados passam a ser acessados eletronicamente substituindo os tradicionais documentos em papel. Essa tendência tem movimentado todo o segmento da saúde para implantação de prontuários eletrônicos de saúde, e entre outros, sistemas de transmissão de resultados de exames de imagem e laboratoriais.
O uso de computadores desktop para acesso a dados eletrônicos, certamente ainda irá dominar o cenário da saúde, entretanto, dividem um espaço cada vez mais ocupado pelos dispositivos móveis. A qualidade da tecnologia dos smartphones, uma revolução dos PDAs (Personal Digital Assistant também conhecidos como Palmtop Computer), e os tablets, transformaram o modo de acessar, coletar, armazenar, e tratar dados em saúde.
Apaixonada por tecnologias, e tudo que possa facilitar o manejo e acesso a informações, inserção de dados, programação de notificações, e entre outras coisas, pelo potencial multitarefa dos dispositivos móveis, não me permito deixar de fomentar um quê de dúvida neste romance. Estes dispositivos e aplicativos entusiasmam, entretanto, é importante que façamos o exercício de pensar criticamente a respeito do que vimos instalando em nossos tablets e smartphones.
Com a adesão crescente ao uso de aplicativos na área de saúde, seja pelo público leigo, seja por profissionais de saúde, e tendo em vista que a medicina moderna é uma ciência com forte base na tomada de decisões baseada em evidências relevantes, é importante aplacar a febre do uso indiscriminado dos aplicativos. O Food and Drug Administration (FDA), órgão responsável pela Administração da Alimentação e Medicamentos nos Estados Unidos, desde 2011 tem desenvolvido todo um trabalho para qualificar os aplicativos, e indicar aqueles que podem ser utilizados com segurança por seus usuários. Segundo o FDA, com o aumento dos aplicativos móveis também veio a necessidade de sua regulamentação, da classificação dos aplicativos médicos, estabelecimento de bases legais, requisitos e responsabilidades, tendo em foco todos os envolvidos neste cenário.
Enquanto isso, no Brasil, quem irá regulamentar a utilização dos aplicativos com fins de aplicação à saúde? Só na Apple, por exemplo, a febre de aplicativos para iphone, disponíveis até julho de 2011, de acordo com o informado pela empresa ao FDA alcançou temperaturas de mais de 350.000 aplicativos, incluindo-se aqui os da área da saúde.
Evidentemente o público leigo compõe a maior parcela dos usuários que consome aplicativos voltados para acesso à informação em saúde, coleta e armazenamento de dados de saúde pessoais. E isso por si só sinaliza que seu uso é uma questão de Saúde Pública. Há aplicativos que coletam, por exemplo, dados fisiológicos como a frequência cardíaca. Devido à disponibilidade de vários apps para este fim, a escolha de um aplicativo com baixa precisão na coleta de dados pode colocar a saúde do usuário em risco e induzi-lo, por exemplo, a uma má decisão na hora de avaliar a necessidade de procurar assistência médica. De quem é a responsabilidade neste caso? E a complexidade desta questão alcançaria um novo patamar se abordássemos a questão da segurança da informação de saúde coletada pelo aplicativo.
E mais uma vez estou entusiasmada, ardendo em febre, porque adquiri novos aplicativos. Enquanto não forem determinados parâmetros de qualidade e segurança oficiais para a comercialização e disponibilização destes aplicativos para o Brasil, seja via Agência Nacional de Saúde, Ministério da Saúde, Sociedade Brasileira de Informática em Saúde, ou pelos diversos Conselhos Federais de especialidades de saúde, sugiro aplacar a febre dos aplicativos com algumas gotas de dipirona:
- Nunca considere à primeira vista nenhuma tecnologia móvel ou aplicativo tão bons que não possam passar pelo crivo de uma avaliação criteriosa;
- Conselhos Federais de diversas especialidades da área da saúde têm desenvolvido e disponibilizado aplicativos nas apps stores. Adquirir um aplicativo advindo de uma entidade de saúde especialista no conteúdo do aplicativo adquirido é uma forma de aumentar a probabilidade de acesso a um conteúdo de qualidade;
- Procure por informações que possam indicar se algum estudo foi realizado para validar o aplicativo;
- Procure informações sobre o desenvolvedor do aplicativo. Informações por exemplo, sobre o envolvimento de profissionais de saúde especialistas na área para a qual o aplicativo foi desenvolvido;
- Verifique partes do conteúdo disponibilizado pelo aplicativo e veja se está correto a partir de uma fonte de consulta sabidamente de qualidade. No caso de dificuldade peça um especialista no assunto para dar sua opinião sobre a qualidade da informação;
- Verifique se a função do aplicativo é compatível com o dispositivo móvel que dispõe. Para visualização de imagens de RX, por exemplo, um smartphone não é o melhor dispositivo para visualizar este tipo de arquivo. Neste caso um ipad é uma opção melhor, ainda que alguns profissionais advoguem que mesmo esse tipo de dispositivo pode comprometer a avaliação de imagem visualizada.
- Desconfie de aplicativos que fazem promessas de cura tentadoras, como por exemplo, curar a depressão sem acompanhamento de um profissional qualificado;
- Lembre-se, o depoimento de uso de um aplicativo por uma pessoa pública, como um ator, por exemplo, não é parâmetro confiável para dizer da qualidade do aplicativo.
Nota: A utilização do nome dipirona presta-se apenas para fins literários, e, portanto, não reflete qualquer indicação deste composto para tratar sintomas relacionados à febre. Consulte um médico na vigência de deste sintoma.
Drª. Luciana
Alves
Neuropsicóloga, Mestre e Doutora em Ciências
da Saúde, Pós-doutoranda no ICB-UFMG com temática relacionada à Infoveillance & Infodemiology – Instituto
Nacional de Ciência e Tecnologia em Dengue. É professora de Informática em
Saúde, e preside a empresa Bionics Health
Technology.
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